Estabelecer o que somos entre o hábito e o habitar não é apenas uma questão semântica. Entre o que nos acostumamos a fazer e o modo como esse costume habita o mundo há toda uma existência de escolhas e renúncias que em última instância está sujeita ao crivo da capacidade interpretativa daqueles que se relacionam direita ou indiretamente com o resultado do gerúndio de nossa jornada terrena.
Existindo, escolhendo, renunciando, apaziguando e combatendo, recebendo e doando é como vamos construindo nossa caminhada, nossas relações e nossas definições.
Fato é que ao longo da trajetória pouco nos damos conta, se é que nos damos conta, do quão automatizados nos relacionamos com nossos afazeres e até mesmo com nossos afetos.
Colocar consciência dentro do nosso cotidiano é um ato de rebeldia porque provoca, naqueles que se distraem em seus automatismos, um estranhamento reativo em relação àqueles que buscam presença e reflexão em seus próprios atos, isto porque, quem se habitua a habitar de forma consciente os espaços que lhe são próprios e a si mesmo é, via de regra, pessoa promotora de novas experiências, o que me parece ser bastante aversivo a quem só reproduz a linha de produção.
Hábito nos condiciona ao confortável estado de um cotidiano previsível, mas também pode nos entregar o automatismo de nossas respostas ao mundo nos incapacitando para a verdadeira experiência de habitar o mundo.
Habitar o mundo e a si próprio requer atenção e consciência e a presença que esses dois estados mentais promovem a quem os pratica.
Habitar requer respostas genuínas, autênticas em relação ao que o mundo possa apresentar. Isto requer coragem, requer audácia, requer que, independente do julgamento alheio, o ser siga fiel a si mesmo, aos seus princípios, aos seus instintos mais selvagens e à sua capacidade transgressora.
O hábito promove a domesticação passiva das nossas respostas sob a luz de um mundo previsivelmente decretado em sua concretude moral, factual e socialmente conveniente.
Hábito é julgamento e habitar é a transcendência que busca entender o ensinamento contido em cada vivência genuinamente experienciada pelo ser que habita a si mesmo.
O convite aqui é buscar-se incessantemente para que a vivência terrena se torne genuína em cada resposta cotidiana às experiências que o mundo nos apresenta, entretanto, essa postura perante a vida será, às mais das vezes, uma trajetória pontuada por feitos de resistência e resiliência na mesma medida em que genuíno e autêntico se mostrarem transgressores em relação à moral vigente.
Essa é uma tarefa possível apenas para quem busca conhecer-se profundamente.
Essa é a tarefa do analizando da clínica fenomenológico hermenêutica.
Sejam bem vindos todos que aqui chegarem!
Karina Zapater
Psicóloga
CRP 06/184974